21 maio O joelho da corredora
A quantidade de mulheres que ingressam na corrida de rua tem aumentado de maneira crescente. Desde que a americana, Kathrine Switzer, correu a Maratona de Boston em 1967, disfarçada de homem, e quebrou o tabu, de que as mulheres “não tinham força e resistência para correr os 42.195 metros”, as mulheres não pararam mais de aderir ao movimento de saúde e qualidade de vida, através da caminhada e corrida. Aliado à isso, o surgimento de assessorias e campeonatos focadas no sexo feminino nos últimos 10 anos, sem dúvida fomentam esta explosão de corredoras nas ruas.
Segundo o site Running USA, as mulheres já representam 53% dos corredores. O número foi apresentado no 19º Congresso Mundial da AIMS (Associação de Maratonas Internacionais e Corridas de Distância) em Praga, República Checa, que aconteceu de 10 a 12 de maio de 2012.
Estudos publicados nos últimos 20 anos mostram que as mulheres não apenas estão se lesionando, mas que o fazem em taxas absurdamente maior que os homens. Para a corrida de rua, esta proporção de lesão no joelho extrapola o índice de 1 homem para 7 lesões mulheres lesionadas para a mesma intensidade e volume dos treinos. Mas, por que isso ocorreria? Seria o uso do salto alto, força muscular reduzida? Anatomia?
Por que a mulher é mais suscetível ?
Autores que estudam a mulher corredora afirmam que as atletas exibiriam um tempo de recrutamento de grupos musculares mais prolongado que os observados em homens e que isso poderia afetar a dinâmica de diversas articulações, principalmente do joelho. De maneira mais didática, isso significa que, em uma aterrissagem do vôlei, por exemplo, o “comando” vindo do cérebro para que a musculatura se contraia de maneira adequada, chega “atrasado” em alguns músculos, principalmente nos glúteos médio e mínimo no quadril (músculos estabilizadores da Pelve) e no vasto medial (músculo interno da coxa) fazendo com que as o fêmur “rode para dentro” e deixe a patela mais lateralizada e em contato reduzido das superfícies articulares. Quanto menor a área de contato, maior a pressão e, consequentemente, maior a chance de lesão crônica de tecidos, em especial a cartilagem patelar. Nos últimos 5 anos, alguns autores provaram existir o valgo dinâmico (figura 1) através do exame chamado eletromiografia e da ressonância magnética dinâmica (em movimento) e postulam que o problema das mulheres corredoras é na verdade funcional e não só anatômico, como se pensava há 30 anos atrás.
Isso significa que a cada passo da corrida, a mulher estaria sujeita ao valgo dinâmico? Sim. A fase inicial da corrida é chamada de absorção de impacto, no qual a energia cinética do contato do pé ao solo é absorvida através da contração muscular e da flexão do joelho. Havendo o valgo dinâmico, existiria um microtrauma de repetição que, a médio e longo prazo desenvolveriam sintomas como a dor, desconforto e inchaço no joelho.
A figura 1 mostra a diferença de uma aterrissagem de uma mulher (à esquerda) e de um homem (à direita). Note que os joelhos da mulher caem “para dentro” (valgizado) e em rotação interna e que isso não acontece com o homem.
Doenças do joelho da mulher corredora
Tendinite Patelar
Apesar de ser mais prevalente em indivíduos do sexo masculino , estatisticamente estaria ligada à alterações anatômicas como a patela alta. Pode ser difusa (pegando todo o tendão), só no polo inferior da Patela, denominada “jumpers knee” pela literatura americana. Há caráter inflamatório inicial e, se não tratada, pode degenerar e levar à ruptura espontânea, descrita em alguns casos.
Quando se opera?
Em geral, após falha do tratamento conservador, indica-se o tratamento cirúrgico. Os dois principais procedimentos cirúrgicos incluem a perfuração do polo envolvido e a ex-cisão da área acometida do tendão.
O objetivo da perfuração é aumentar o suprimento vascular para a área afetada. Recentemente, com o advento da artroscopia do joelho, é possível que seja realizada sem a incisão anterior clássica. O segundo procedimento envolve a ex-cisão longitudinal do tendão envolvido. Conforme relatado por Blazina et al, em 1973, o principal benefício deste procedimento é que ele permitiria retirada de todo o tendão doente, com posterior cicatrização da lesão.
Além da cirurgia, existem outros tratamentos?
Embora ainda em estudo, autores relatam sucesso no tratamento da doença com a terapia por ondas de choque (TOC). Nesta técnica, uma máquina emite pulsos semelhantes aos usados nas quebras de cálculos renais sobre o tendão doente. A partir daí, ocorreriam estímulos à cicatrização da lesão.
Sinovite difusa
Trata-se de uma reação inflamatória difusa, acometendo a membrana articular, denominada sinóvia e pode se estender a outras estruturas, como o coxim gorduroso, ou gordura de Hoffa da região anterior do Joelho. Acomete principalmente mulheres após a segunda década de vida, envolvidas ou não com atividades físicas, o que levou a muitos autores intitularem a condição como “o joelho da mulher” na década passada.
Quando surge na mulher corredora traduz que o esporte está ultrapassando os limites fisiológicos e os tecidos do joelho estão sobrecarregados.
Em geral, sintomas ocorrem em atividades da vida diária, como subir e descer escadas, estando intimamente associado ao uso excessivo de salto alto e podem limitar muito a prática esportiva.
Embora a sintomatologia seja exuberante, muitas vezes não há relação direta com os achados de exames de imagem, como na ressonância nuclear magnética, por exemplo e a grande maioria das pacientes melhora com uma boa reabilitação.
Condromalácia
O termo vem do latim e significa, em sua essência, “amolecimento da cartilagem”. Muito comentada e estudada desde o início dos anos 90 com o advento da Ressonância Nuclear Magnética como ferramenta diagnostica de lesões no joelho.
Dentre o rol de doenças do joelho da mulher corredora, esta estaria intimamente ligada ao valgo dinâmico e, infelizmente, tratada de maneira incorreta em muitos casos.
Conforme descrito acima, postula-se que a doença desenvolva-se a partir do contato excessivo da cartilagem da rótula que estaria lateralizada em relação ao seu “trilho”, a tróclea femoral. A distribuição desigual dos pontos de pressão causaria, em longo prazo, morte celular e desarranjo da matriz extracelular, com consequentes sintomas de dor, crepitação ou sensação semelhante a “areia” dentro do joelho, estalos e ,às vezes, falseios. No início, a lesão dá-se por amolecimento da cartilagem. A seguir, podem haver ulcerações, fissuras, terminando com o desgaste de toda sua espessura, evoluindo, assim como qualquer lesão cartilaginosa, para a osteoartrose.
O tratamento é não cirúrgico na grande maioria dos casos e fundamenta-se na detecção da presença valgo dinâmico e de desequilíbrios musculares através do teste de força ou avaliação isocinetica. A reabilitação envolve recursos anti-inflamatórios iniciais como o laser e o ultrassom, seguidos da ativação de grupos musculares enfraquecidos, muitas vezes com auxilio da eletroterapia (correntes russa ou australiana), seguida do fortalecimento e aumento do tempo de ativação de grupos musculares através dos treinos proprioceptivos e pliométricos. Muitas vezes, o uso do salto alto deve ser reduzido por determinado período e pisadas muito pronadas ou muito supinadas também devem ser tratadas.
Tratamento cirúrgico
O tratamento cirúrgico se reserva aos casos quem não melhoraram com a reabilitação bem feita, com defeito cartilaginoso de graus III ou IV e com encurtamento crônico da retinácula lateral (tecido que segura a patela na região externa). Nestes casos, através da artroscopia do joelho pode se realizar a regularização da cartilagem lesada, retirada de corpos livres e a soltura da retinácula encurtada, procedimento chamado de “release lateral”. Terapias adjuvantes como a aplicação intra-articular de ácido hialurônico no período pós-operatório auxilia no tratamento e previne a recidiva de sintomas.
Síndrome do atrito íleotibial
Lesão extremamente frequente em ciclistas e corredores. Ocorre devido à fricção da banda fibrosa lateral chamada banda ileotibial com a proeminência óssea lateral do joelho, o epicôndilo lateral. Ocorre reação inflamatória localizada que, caracteristicamente, dói durante a corrida e pedalada e melhora após o repouso. Indivíduos que pedalam de maneira incorreta com banco muito alto, trazendo o joelho muito próximo à linha mediana da bicicleta, assim como as portadoras de Genu varum ou “joelho arqueado” são mais suscetíveis à lesão.
O tratamento envolve alongamento da banda ileotibial sob manipulação do fisioterapeuta e fortalecimento dos músculos estabilizadores da pelve, em especial do glúteo médio e rotadores do quadril. Nos casos que não melhoram, terapias como as ondas de choque e infiltrações tem tido bom resultado.
Muito raramente, pacientes com esta doença necessitam de tratamento cirúrgico que inclui o alongamento da banda ileotibial (zetaplastia) ou a retirada da proeminência óssea (epicôndilo lateral).
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Dr. Adriano Leonardi
Médico ortopedista especialista em cirurgia do joelho e traumatologia do esporte.
Mestre em ortopedia e traumatologia pela Santa Casa de São Paulo.
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